Política entre as ideias e a realidade

Nos anos 1980 no Reino Unido. Os trabalhistas viveram uma crise de valores diante do fortalecimento do Thatcherismo com suas reformas econômicas. O passado de socializações foi abandonado para abraçar uma nova realidade para o eleitor britânico. Isso ficou evidente na intervenção da executiva nacional no conselho municipal de Liverpool em 1985 onde o partido tinha controle por causa do socialismo revolucionário tão criticado pelo então líder trabalhista Neil Kinnock.

Nessa crise surgiu um movimento dentro do partido de militantes gays pedindo apoio para a causa que foi ignorada por alas ligadas ao movimento sindical. Tal movimento é sinalizado hoje com a perda de força das alas proletárias diante de questões identitárias e das minorias. O Partido Trabalhista tem um problema sério com a questão do antissemitismo que foi um dos fatores para a derrota acachapante na eleição geral de 2019.

Partidos seja esquerda seja direita perdem força por focarem em polarizações ideológicas que ignoram a dura realidade de uma nação ou sociedade. Na Alemanha, o Partido Verde foi eleito o alvo Nº 1 do ministro-presidente da Bavária, Markus Söder, em campanha de reeleição onde ele lidera o união social-cristã onde o partido governa o estado alemão desde 1949. A causa: a questão da limitação de velocidade nas autobahns e o fim dos motores a combustão em prol de carros elétricos.

O jogo político em que as ideias são mais sedutoras que a realidade e vice-versa nos mostra que o elo entre o pragmatismo e a demagogia estão em um campo de uma guerra cultural. Na Austrália, o líder liberal Peter Dutton decidiu entrar de sola no referendo onde se discute a inclusão dos povos originários como nações fundadores do país na constituição australiana. A votação é uma promessa de campanha do primeiro-ministro trabalhista Anthony Albanese.

O que está claro é que o eleitor está prestes a levar em conta as opiniões invés de propostas de governo. A democracia precisa de boas ideias junto com políticas cujo o objetivo comum é melhorar um panorama social. As guerras culturais em temas como mobilidade urbana ou inclusão de setores sociais nos mostram um atraso intelectual e político que não nos ajuda a ir pra frente e ficarmos presos a demagogias invés de uma visão clara sobre a realidade.

Como escrever um ensaio sobre o mundo contemporâneo?

Minha amiga colunista da folha é editora de uma revista acadêmica que discute as questões de gênero. Logo perguntei se tinham um blog e ela me respondeu que sim. Então, me candidatei para escrever um texto sobre o assunto em voga como a questão da relação entre homens e mulheres no mundo contemporâneo. Mas tenho que ser honesto com as pessoas.

Eu sou um colecionador da revistas masculinas como Playboy e Sexy. Mas lidamos em um tempo onde a nudez é castigada com razão. Ao mesmo tempo que vemos os extremismos do sexismo onde os prazeres mudanos são considerados pecados mortais por aqueles que se consideram paladinos da razão pelo simples fato de defender as aparências de uma sociedade.

O paradoxal é que Hugh Hefner, Bob Curcionne e Larry Flint foram defensores da liberdade de expressão nos Estados Unidos da Era Reagan mesmo sendo donos de revistas como Playboy, Penthouse e Hustler respectivamente. Ao mesmo tempo que tinham que lidar com a revolta feminista contra a objetificação da mulher como fez Gloria Steinem em um ensaio na revista Show em 1963 onde descrevia os dias de trabalho como coelhinha no Playboy Club de Chicago.

Como homem caipira do interior. A revista masculina é vista como um símbolo de virilidade e uma dor de cabeça para quem for casado. Isso me lembra de uma vez que meu amigo Renan me deu um baralho da Playboy de 1992 porque começara a namorar e eu era o único adolescente solteiro da minha turma. Tanto que tenho esse objeto até aqui em casa.

Hoje, as revistas masculinas são vistas como algo antiquado. Mas o legado para homens e mulheres e as pessoas trans é que permitiram uma longa discussão sobre a sexualidade humana. Ao mesmo tempo que a decadência de tal modelo de negócio ficou evidente nos últimos anos com a morte de Bob e Hugh junto com a obsessão de Flint em desvendar os podres públicos. Enfim, este é o mundo contemporâneo.

Humor segmentado

Na minha adolescência, eu lia as crônicas de Carlos Eduardo Novaes na biblioteca da minha escola como uma forma de entender o Brasil em 1977. Hoje, o humor virou uma coisa segmentada. Percebi isso ao ver o vídeo do Canal Hipocritas no youtube. As piadas foram péssimamente redigidas e de gosto duvidoso ao zoar a adolescente sueca Greta Thunberg.

Tenho as minhas ressalvas a Greta. Mas quando vejo humoristas se declarando cristãos, conservadores, socialistas, celebridades e afins. Percebo que tem uma coisa errada na função de fazer rir o próximo. O humorista tem a função de ser a metralhadora giratória de uma sociedade em meio aos seus conflitos sociais. Mas hoje, eles fazem piadas sobre pessoas com deficiência ou atacam as ideologias com o fim de fazer média com a plebe.

Uma sociedade que não sabe rir de si mesma como o Brasil dos tempos atuais estará em seu eterno atraso cultural e intelectual. Logo percebemos que não sabemos redigir um texto de humor com sarcasmo sobre o mundo contemporâneo. Então, vemos uma mediocridade epidêmica onde a ofensa é vista como virtude invés de ser repudiada com veemência.

O politicamente seja correto seja incorreto lida com esse problema de ter uma patrulha barulhenta. O humor feito no Brasil não tem um sentimento de cartase social contra uma onda de repúdio ao autoritarismo. A sociedade fica refém de pessoas que pensam que uma piada é uma bomba atômica como é descrito no filme Coringa onde Gotham beira ao caos.

O dramaturgo alemão Bertolt Brecht criou a figura do Herr Keuner como uma forma de crítica a sociedade alemã nos anos 1930. Tais textos ficaram escondidos na Suíça até o ano de 2002. Logo percebemos que quando temos um humor segmentado para agradar a bolha. A sociedade não vai pra frente para arrumar o estado das coisas como bem descritos nas crônicas de Carlos Eduardo Novaes.

As premissas

A sociedade nos exige que vivemos em profunda harmonia mesmo tendo pensamentos diferentes. Percebo isso quando vejo os meus conhecidos brigando para ver quem tenha razão em assuntos importantes como a questão religiosa. Logo, lido com a função de um mediador entre tais pessoas.

Uma premissa importante é respeitar a opinião do próximo. Mas nossa sociedade esqueceu isso em algum lugar da gaveta mental pelo simples fato de reafirmar sua visão de mundo perante um ser que considera herege pela ótica de pensar diferente de si e isso é posto como uma afronta ao nosso status quo.

Em democracia maduras, os partidos políticos tem uma visão ideológica que permite a dissidência e a luta pelo poder entre diferentes correntes ideológicas onde o debate público se faz presente por meio de artigos e entrevistas onde se reafirma sua visão de mundo sem desrespeitar o jogo democrático.

Mas lido com pessoas que não respeitam essa premissa pelo simples fato de desejar ter razão e impor isso como se fosse uma porretada intelectual. Mas lidamos com a necessidade de compreender as questões de fundo opinativo e valores pessoais de maneira mais inteligente possível para evitar confusões.

A premissa de entendermos as entranhas do jogo democrático se faz necessário em um momento onde nós nos questionamos sobre a validade das liberdades individuais possa ser sacrificada em prol de um bem-estar comum e coletivo. Enfim, teremos um longo debate pela frente no mundo virtual.

Brasil: uma chatice

Eu sempre lido com pessoas que se acham super-inteligentes no twitter. Sempre comentando as novidades desconhecidas da música brasileira. Uma vez, fui ridicularizado pelo negão-cinquentão porque ouvia música australiana invés de escutar a nossa chatice intelectual do MPB tupiniquim. Mas ele ficou surpreso com a minha resposta elogiando uma canção da terra dos cangurus sem firulas.

Tal causo é um retrato de nosso país tão chato e tão medíocre. Se vossa senhoria gostar de música australiana é tachado como um traíra da pátria. Se não gostar da literatura brasileira contemporânea é visto como um lacaio do imperialismo americano. Caso não aturar as opiniões de nossos formadores de opinião, logo falam para sair de nossa pátria amada.

O grande problema é que o Brasil teve momentos de modernização intelectual e cultural como a bossa nova, tropicália e o cinema novo nos anos 1960. Mas tal processo não deu certo por causa de nossas invejas culturais junto com o autoritarismo do período militar. As patrulhas ideológicas podavam qualquer manifestação interessante fora da zona sul do Rio de Janeiro como as pornochanchadas e a música brega.

Ao mesmo tempo e anos mais tarde. Isso permitiu o surgimento de novos polos culturais tendo como a válvula de escape a rede mundial de computadores que não tinha um pensamento coronelista que marcou a geração de 1960. Além de permitir uma contestação nos moldes não-maoístas onde a ruptura se desenhou de maneira gradual e segura.

Hoje, vejo amigos lendo romances policiais escandinavos com o propósito de amadurecer o seu processo de criação junto com o fato de consumir a produção estrangeira sem ter uma patrulha por perto. A teoria do exotismo dos trópicos ainda me incomoda por não pemitir uma contestação cultural e nos reinventarmos. Isso explica por que o Brasil é uma chatice.